Pesquisa do Ipec, que ouviu 2.002 pessoas, aponta que 22% diminuíram a compra de alimentos básicos para pagar a conta de luz
As crises hídrica e energética, os caminhos adotados pelo governo federal para enfrentá-las, e o aumento do preço da conta de luz e do gás impõem um sacrifício grande para os brasileiros, especialmente os mais pobres. Uma pesquisa do Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria), contratada pelo iCS (Instituto Clima e Sociedade), mediu este impacto e concluiu que o gasto com gás e energia elétrica já compromete metade ou mais da renda de 46% das famílias brasileiras, sendo que 10% comprometem quase toda a renda familiar com esses gastos, 12% mais da metade da renda familiar e 24% a metade da renda familiar.
O Ipec ouviu 2002 pessoas com 16 anos ou mais em todas as regiões do Brasil entre 11 e 17 de novembro. Para 90%, o atual valor da conta de luz está impactando “muito” ou “um pouco” o dia-a-dia das famílias, e para poder pagá-la quatro em cada dez brasileiros (40%) diminuíram ou deixaram de comprar roupas, sapatos e eletrodomésticos. Ainda, nada menos do que 22% diminuíram a compra de alimentos básicos para garantir a energia em suas casas, índice que chega a 28% entre os nordestinos. Além disso, 14% deixaram de pagar contas básicas como as de água e gás encanado.
O levantamento aponta também uma mudança de comportamento dos brasileiros para tentar diminuir a conta de luz: metade (49%) afirma ter adotado ações como tomar banho mais rápido e desligar as lâmpadas, e 44% dizem ter deixado de usar ou ter reduzido o uso de eletrodomésticos que consomem muita energia. Muitos foram além: 42% substituíram lâmpadas por outras mais econômicas, e 23% passaram a evitar o consumo de muita energia nos horários de pico. Só 5% declaram usar fontes alternativas renováveis, como a solar, e 18% não mudaram seus hábitos.
O aumento no preço do botijão de gás é o mais sentido pela população: 52% dizem que, entre as fontes de energia (elétrica, gás encanado e botijão), o aumento do botijão foi o que mais pesou no bolso, e 42% apontam o da energia elétrica. Um em cada dez brasileiros passou a usar lenha para cozinhar, 6% passaram a usar carvão, e 4% o fogão elétrico.
Não foi apenas o gasto com gás e energia que prejudicou a rotina das famílias em 2021. Mais da metade dos entrevistados (52%) disse ter sofrido interrupção no fornecimento de água nos últimos 12 meses. No Nordeste, foram 61%.
A pesquisa evidencia também que as crises hídrica e energética são amplamente reconhecidas pela população e trazem grandes preocupações: 79% ouviram falar da crise hídrica, e 68% da crise energética. Nove em cada dez se preocupam com a possibilidade de racionamento ou de apagões no futuro próximo, sendo 70% aqueles que dizem se preocupar muito. A preocupação é maior nas capitais e nas cidades de seu entorno (periferias).
Seis em cada dez entrevistados dizem ter gasto mais energia este ano, e nove em cada dez notaram o aumento na conta de luz. O governo federal (47%) e os governos estaduais (43%) são apontados como os principais responsáveis por esse aumento, seguidos pelas empresas de energia (32%) e as usinas hidrelétricas (20%). Por outro lado, 71% afirmam não ter tomado conhecimento sobre as propostas do governo federal para a redução voluntária no consumo.
O brasileiro não está nada otimista em relação ao futuro da conta de luz: 76% afirmam que ela vai aumentar ano que vem, sendo que 51% acham que vai “aumentar muito”. Apenas 12% acham que continuará igual, e 7% acreditam em contas mais baratas. Quase todos os brasileiros (89%) temem possíveis aumentos no preço da conta de luz em casa no ano que vem. Nada menos do que 66% dizem ter “muito medo” de possíveis aumentos, 23% “um pouco de medo”, e 8% não têm medo algum. Três em cada quatro brasileiros acreditam que o custo da energia vai elevar os preços dos produtos básicos. No Nordeste, esta percepção chega a 81%.
A falta de água preocupa a quase totalidade dos brasileiros: 78% dizem que se preocupam muito, 14% que se preocupam um pouco, e apenas 6% não se preocupam. Os mais preocupados são os mais escolarizados (84%), os que vivem no Nordeste (84%), nas periferias das grandes cidades (82%) e em municípios de porte médio (82%).
A grande maioria (70%) considera que houve descaso do governo federal no enfrentamento da crise hídrica. E pensando no futuro, a pesquisa revela que o país não está otimista em relação ao impacto das mudanças climáticas: nove em cada dez (88%) avaliam que as mudanças climáticas estão impactando o regime de chuvas no Brasil, e para 56% dos brasileiros, as mudanças no clima vão piorar o volume de chuvas no futuro.
A pesquisa traz uma boa notícia sobre a consciência dos brasileiros em relação à importância da eficiência energética. Perguntados se consideram a eficiência dos eletrodomésticos na hora de escolher qual vai comprar, 52% dizem que sempre, 16% quase sempre, 13% raramente, e 17% ignoram os selos e etiquetas de eficiência energética.
A população tem uma percepção positiva sobre as energias renováveis. Nada menos do que 81% querem que elas sejam ampliadas. Para 69%, as renováveis agridem menos o meio ambiente, e 64% dizem que o investimento em energia renovável contribui para gerar empregos. Metade (50%) acha que elas são mais baratas do que as não renováveis, mas 31% acreditam que sejam mais caras. A confiabilidade das renováveis é alta: para 59%, elas são tão confiáveis quanto as convencionais, enquanto 25% as veem como menos confiáveis.
Por fim, a pesquisa mostra a demanda da população com relação à ampliação da energia limpa no país e entende que esse tema deveria ser uma prioridade para os(as) presidenciáveis no ano que vem. A maioria dos brasileiros (77%) afirma que propostas para ampliar o uso de energias renováveis no Brasil deveriam ser uma prioridade dos(as) candidatos(as) à Presidência da República no ano que vem. E 81% dizem que propostas que visem evitar a ocorrência de crises hídricas no futuro deveriam ser priorizadas pelas candidaturas.